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Breve análise do art. 8º da Lei Complementar 173, no que se refere a despesas com pessoal.


por Valéria Salgado, 10 de Julho de 2020

A Lei Complementar Federal nº 173, de 27 de maio de 2020 (LC173) instituiu o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus SARS-CoV-2 (Covid-19) e estabeleceu, dentre outros dispositivos, proibições específicas para a gestão de pessoal na Administração Pública, a vigorarem durante a ocorrência de calamidade pública, reconhecida pelos Poderes Legislativos dos Entes da Federação Brasileira. Essas proibições têm vigência até 31 de dezembro de 2021.

De acordo com a citada Lei Complementar:

a) está proibida a concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação da remuneração dos servidores e empregados públicos, civis e militares, exceto quando determinada por sentença judicial, transitada em julgado ou aprovada por lei, anteriormente à calamidade pública (LC173, art.8º-I). A redação dada ao inciso, em sua parte final, permite entender que as vantagens que, eventualmente, tenham sido previstas em lei anterior à edição da LC, podem ser concedidas, ainda que não tenham sido implementadas até o momento;

b) está proibida a criação de cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa (LC173, art.8º-II). Assim, a criação de cargos, empregos ou funções na Administração Pública fica condicionada à extinção de outros cargos, empregos e funções, na mesma medida da nova despesa a ser realizada;

c) está proibida qualquer alteração na estrutura de carreira, que implique em aumento de despesa (LC173, art.8º-III);

d) está proibida a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título (LC173, art.8º-IV). Ficam permitidas, no entanto, para qualquer setor da administração pública, a admissão ou contratação de pessoal que vise, exclusivamente, repor cargos em comissão, sem aumento de despesas, assim como os cargos efetivos ou vitalícios que estivem vagos;

e) as contratações temporárias também são permitidas, em todos os setores, desde que destinadas à atender a necessidade temporária dos serviços; assim como as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares (LC173, art.8º-IV);

f) está proibida a realização de concurso público, exceto para repor as vacâncias dos cargos efetivos ou vitalícios vagos (LC173, art.8º-V);

g) está proibida a criação ou o aumento do valor de auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório para servidores ou empregados públicos, civis ou militares e para seus dependentes; exceto por sentença judicial, transitada em julgado ou por determinação legal anterior à calamidade pública (LC173, art.8º-VI);

h) está proibida a criação de despesa obrigatória de caráter continuado; com exceção das despesas que decorrem das medidas de combate à calamidade pública, cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração. Podem, ainda, ser criadas despesas obrigatórias quando houver prévia compensação pelo aumento de receita ou redução de despesas. Quando houver a previsão de que a despesa ultrapassará dois exercícios financeiros, a compensação deverá ser permanente (LC173, art.8º-VII);

i) está proibida a adoção de medida que implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação, medida pelo IPCA, respeitados os reajustes periódicos do salário mínimo, voltados a preservar o poder aquisitivo dos trabalhadores (LC173, art.8º-VIII); e

j) está proibida a contagem de tempo da pandemia como de período aquisitivo para concessão de anuênios, triênios, quinquênios e licenças-prêmios e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins (LC173, art.8º-IX).

Nos termos da Lei Complementar nº 173, os setores responsáveis pelas medidas de combate ao Covid-19, como é o caso da saúde, estão isentos de algumas das proibições, desde que para o enfretamento e combate à pandemia, podendo:

I - criar cargos, empregos e funções com aumento de despesa;

II - admitir ou contratar pessoal para provimento de novos postos de trabalho;

III - criar despesas e adotar medidas que gerem reajuste de despesa obrigatória acima da inflação.


O texto legal não deixa claro se seria possível realizar concurso público para o provimento de novos cargos, empregos e funções porventura criados, nos setores envolvidos no combate à pandemia, visto que excepciona a realização de concurso apenas para repor vacâncias em cargos e empregos já existentes.


Finalmente, e apenas para os profissionais de saúde e assistência social efetivamente envolvidos nas atividades de combate à Pandemia do Covid-19, a Lei Complementar permite a criação ou a majoração de auxílios, vantagens, bônus, abonos e verbas de representação.


Como conclusões da análise do texto da Lei Complementar 173, no que se refere à gestão de pessoas, tem-se que:

a) podem ser criados cargos, empregos ou funções desde que não haja aumento de despesa;

b) podem ser realizados concursos públicos, em qualquer área do Setor Público para prover os cargos e empregos vagos, criados antes da pandemia;

c) o concurso público, em geral, para provimento de cargos e empregos criados durante a pandemia está proibido;

d) nos setores envolvidos no combate à pandemia pode haver a criação de cargos, empregos e funções, com aumento de despesa, mas permanece a dúvida da vedação da realização de concurso públicos para o seu provimento. Assim, pode-se entender que a autorização de aumento de despesa restringe-se, de fato, à criação de cargos em comissão e funções comissionadas que prescindem da realização de concurso público. Diante da dúvida, é oportuno que os Governos solicitem aos seus órgãos de assessoramento jurídico o posicionamento sobre a matéria, para evitar surpresas futuras, especialmente, junto aos órgãos de controle externo;

e) a contratação temporária é permitida para todos os setores, desde que seja, exclusivamente, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do inciso IX do art. 37 da Constituição Federal. Com base nas orientações da Secretaria de Orçamento Federal[1], acerca do enquadramento das despesas com pessoal contratado por tempo determinado, essas contratações, por não objetivarem a substituição de pessoal do setor público, mas atender às necessidades específicas de pessoal, em especial as decorrentes da pandemia, deverão ser enquadradas como GND3 - Outras Despesas Correntes e não como despesa de pessoal (GND1)[2] ; e

f) as contratações de pessoal por tempo determinado que caracterizem a substituição de servidores e empregados públicos estão proibidas. Aliás, essas contratações, de prática comum na administração pública, salvo melhor juízo, não têm fundamento legal, em nenhuma hipótese ou situação, e constituem um desvirtuamento do instituto do contrato por tempo determinado previsto no inciso IX do art. 37 da Constituição Federal.




[2] Somente as despesas relativas à contratação de pessoal por tempo determinado que caracterizem substituição de servidores e empregados públicos são classificadas no GND 1, salvo disposição em contrário constante de legislação vigente.
(Manual SIAFI > 020000 – Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal – SIAFI  > 020300 - MACROFUNÇÕES > 020332 - CLASSIFICAÇÕES ORÇAMENTÁRIAS); e

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